31 Dec
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No underground português, à semelhança do que acontece no mainstream, atualmente são poucos os artistas negros capazes de fugir à gulosa espiral oferecida pela música lúsofona, entre as ofertas mais bem recebidas estão claro o rap e todas as subvertentes do hip-hop; o semba e todas as emergentes procuradorias do soul e do neo-r&b; estes são seguramente os géneros musicais que fazem mais manchete por artistas ora cabo-verdianos, são-tomenses, inclusive angolanos, que têm uma larga tradição no kuduro e outros sub-géneros do big beat africano... Mas este cantor/produtor/multi instrumentista angolano com o nome de EL Sombra, na sua estreia delirante intitulada de "As Aventuras de El Sombra" ousa, como o anti-herói que diz ser, espelhar esta ideia contínua de música psicadélica ligeira, contornando esses mesmos estilos e outros que mesclados, originam numa cachupa de sabor e de autenticidade sonora. Mesmo no single principal "Funk-Anti Crise", as flautas que surgem a meio da ponte segunda fazem referência aos estilísticos cantores jazz da era open, e o robótico vocal antes da terceira vaga de refrão "um dia destes vou rebentar" sugere experimentação que falta cada vez mais no mainstream e nos cantares mais populares. E mesmo mantendo um espírito urbano hip-hopístico, El Sombra mantém um mantra rockístico e secular que é sexy, pouco mundano mas muito absurdo e progressivo... "Mundo" parece uma sample que MF Doom usaria numa das suas cruzadas; "Change" sobrepovoado de kraut-synths e de mais mensagens políticas de mudança e consciência social; E depois o des-uso mais próprio do kuduro e das suas atlânticas variações, contemplando desta vez noutro interlúdio do nome "Tema de El Sombra" o house e o eletro-house. Depois as canções são muito escritas de um ponto de vista de um emigrante amante de rock-pop alternativo, fazendo lembrar um pouco Tsunamiz, com mais africanidade. "Malhão" é um soberbo reinventar do grito popular dos arraiais mas envoltos num minimal e muito eletrónico dance-house com algumas escrituras cantor-de-baile e mainstream alternativo; Para terminar com o kraut "Technology" numa clara ode às colagens de Exploded View e fazendo também de El Sombra um synth-freak como um verdadeiro anti-herói. Para terminar com a pergunta "O que é Kuduro?" para inventar mais desculpas para reinventá-lo e brincar com os timbres e texturas destes recorrendo à distorção e a mais poder de beat. Contas feitas, “As Aventuras de El Sombra” são desabafos autênticos de um anti-herói em busca de um confessionário, não de um herói capaz de mudar o mundo ou tão pouco torná-lo indiferente. No seu melhor, é interessante ver experimentaurs angolanos fazerem algo desta génese.  

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