Destiny, uma rapariga do bairro que nasce numa Nova Iorque dominada pelo capitalismo, o bem estar, o entretenimento… Todo esse bem estar é uma constante antítese aos projects, os bairros sociais onde Destiny cresceu. Já sabemos esta velha história dos projetos* sociais americanos, ou estudas (apenas 5% acabam ou prosseguem os seus estudos nos projetos) ou fazes algo produtivo como música ou no banal caso, rap; Ou cais numa vida de crime num submundo onde vives desprotegido e constantemente a olhar por trás dos ombros… No caso de Destiny os dois primeiros, só que um deles tornou-a numa autêntica leoa tigresa de consciência feminista e anti-sexista. Em “Tomboy” Princess Nokia admite ser uma maria-rapaz, e ela simplesmente não quer saber. Ela é provocadora e quebra tabus. “With my little titties and my fat belly” ela também quebra barreiras, ela fala por um nicho de raparigas subordinadas pelo sexo e pela banalização da mulher, a pouco dignificante conversão da mulher como produto e não como outro cérebro. “My body small but my soul big”.
Em "Bart Simpson" mais histórias de infância, de vida no secundário, de como cresceu, da sua cidade, do seu bairro, tudo apontamentos essenciais para compreender melhor esta personalidade que foi construindo ao longo dos tempos. Essa barreira que a envolve ouve-se em “Kitana”, outra maré de cuspo* sobre toda a gente que se opõe a este estado de espírito. Não é a típica canção de um rapper contra os haters, mas sim contra todos que contestam a sua inteligência, o seu carisma e acima de tudo, aquilo que ela mais preza, a sua independência. Mais uma nota para os beats extravagantes de trap, que estão bastante hype nos tempos que correm (na cena do rap). Aliás o próprio título descreve memórias de infância (1992 é o seu ano de nascimento) e nunca se afastando dessa temática Princess é moderna e atual, capaz de usar o seu knowledge para reminiscências como para discutir assuntos de grande importância atual.
Em "Brujas" ela fala dos seus antepassados negros: “I came from Puerto rico, one of the smallest islands, but it got the most people”, aqui ela remonta a tudo aquilo que a tornou na pessoa que é hoje, aliás, remonta a tudo aquilo que a faz lutar diariamente: Preconceito, igualdade racial, Destiny apenas está a acabar o trabalho dos seus e até dos meus antepassados. Até ao smooth "Saggy Denim", histórias de quando tinha 3 anos. Aqui mais arranjos Soul/ R&B que fazem lembrar tudo aquilo que era feito nos anos 90 no que toca a Mc’s/rappers/cantoras americanas. Vai buscar essas influências de Mariah Carey ou mesmo Destiny Child’s e converte essa subtileza pop em rimas nostálgicas, a facilidade em escrever barras sobre um só conceito é absolutamente incrível.
Em "Green Line", a estação de metro, mais histórias de infância: “From 2.50 (bucks) i could go anywhere i want even if they check my bags and hiding weed from the cops, i was on the 6, green line check, i was on the 6”. Do 6 para casa, da casa para escola… Destiny conta-nos uma versão muito mais lúcida daquilo que é a verdadeira Nova Iorque pedante, fora dos filmes e dos contos… Outra questão que a sensibiliza é quando põem em causa a sua educação, maneiras ou etiqueta. A sua independência é absolutamente incontestável, seja a escolher o momento para propagar a sua (natural do ser humano) sexualidade como escolher o estilo do seu cabelo. Ao mesmo tempo que 1992 é um scrapbook de memórias, é também um espelho que reflete tudo aquilo em que Destiny se tornou, desde a miúda do bairro suburbano até hoje, até se tornar Princess Nokia, uma das rappers femininas mais promissoras dos últimos tempos, por várias razões, a sassyness, o caos que as suas palavras trazem, o debate que ela incendeia, a polémica por trás da sua personalidade e acima de tudo, aquilo que ela representa. “Excellent” é a nova vida de Princess Nokia, os cheques com cobertura, as agendas cheias… A genuinidade do seu talento é palpável, deixando um Freestyle caseiro no fim da sua mixtape…
“1992” não é um grito, mas é barulhento. Tudo aquilo que Destiny diz é abençoado pelo toque do Midas. Toda essa preocupação em torno de dilemas que são debatidos um pouco por todo o mundo, toda a sinceridade no retrato da sua cidade manchada pelo álcool, insucesso escolar e drogas (e como ela é um raro caso de sucesso no meio destes problemas), como representa a sua cidade, o seu género, fazem de Princess Nokia um ícone. Irá gravar um longa-duração numa editora Major depois desta mixtape chegar por correio. Se a sua atitude perante a fama, o dinheiro e a popularidade (alicerces do meio em que penetra) não a abduzirem da sua missão, teremos nas mãos um dos álbuns de estreia mais brilhantes do nosso século.