MEIO PALMO DE TESTA/ 4º EPISÓDIO

Miguel Pinto


A Orange Milk Records é uma editora norte-americana fundada por dois amigos, Seth Graham e Keith Rankin, que se inspiraram no nome do clássico A Clockwork Orange do Kubrick para criarem uma label focada na divulgação do que poderíamos apelidar de soundscapes digitais, umas a pender mais para o techno, outras para o plunderphonics, glitch ou ainda música orquestral. Porém, qualquer um dos géneros é-nos apresentado duma forma mais ambiciosa do que o que é natural.

Numa entrevista a Seth Graham, este afirmou que foi quando começou a apreciar vaporwave, e a percecioná-lo como o novo punk rock (existe a mesma falta de técnica, o mesmo ódio por parte das pessoas, e consegue ainda representar esta nova geração) que percebeu a música que queria editar: algo que fosse organicamente subversivo.

Seth Graham e Keith Rankin, os criadores da Orange MilkEste espírito representa na totalidade o papel da editora: com visuais aliados sempre a um surrealismo moderno, poderemos determinar a música aqui apresentada como dadaísmo musical, temos o mesmo questionamento da originalidade, do que significa realmente ser único, e chega-se à mesma conclusão: todos somos originais, a questão é como articulamos a dita cuja.

Nonlinear Record de Genetics and Windsurfing é talvez a obra que melhor demonstra a distinção da editora dos seus pares. Este é dos álbuns mais peculiarmente violentos que alguma vez passaram sobre os meus ouvidos. Glitch’s puros de samples recortados e empurrados aos tímpanos, em composições que acompanham as sinapses do cérebro ou algo parecido. É um álbum de escuta dificílima (é de louvar quem o tenha conseguido ouvir até ao fim, de rajada) mas é absolutamente de valorizar o minucioso trabalho aqui produzido.

Porém, não venho aqui, verdadeiramente, para falar de Nonlinear Record, porque não foi o que mais me encheu as medidas (a brutalidade acaba por cansar a determinada altura). Venho falar-vos de Swimming Pool, dum compositor sueco chamado Hans Appelqvist.

Appelqvist é maioritariamente conhecido pelas suas composições para cinema, principalmente em filmes suecos, e isso é um facto que se vai sentindo ao longo de Swimming Pool, quer pela orquestração aqui introduzida como pela estruturação de algumas das faixas, em jeito de suspense hollywoodesco (num bom sentido é claro). Mas, sem querermos revelar muito, a música de Appelqvist é extremamente cerebral, tanto na sua estrutura como nos súbitos contrastes de som, que poderão vir ao de cima até nas faixas onde tudo parece tranquilo. 

Hans Appelqvist.

Swimming Pool é assim visto como uma novela sonora, num mundo onde a fantasia e a música futurista é envolvida em arranjos orquestrais e vozes hipnóticas. Na descrição do álbum, Hans refere até que tentou encontrar um single para este álbum, mas não conseguiu visto ter considerado que nenhuma faixa era capaz de representar de facto o som do disco. E se o ouvirmos, poderemos confirmá-lo: cada faixa é disparada para outra de um género quase oposto, confirmando o porquê de estar numa editora como a Orange Milk, e obrigando-nos, ouvintes, a uma escuta completa para decifrarmos o que reside por trás desta piscina. Aliás, a imprevisibilidade é de facto um dos trunfos deste disco, assim como da editora, como já sabemos. 

Por isso, se nos dermos ao trabalho de explorar os lançamentos da Orange Milk iremos verificar que qualquer deles são de escuta difícil, porém são capazes de nos conduzir ao espanto com a maior das facilidades. A Orange Milk não é para todos. Mas os incluídos ficam contentes que assim seja, têm uma pérola escondida só para eles.

(A crítica a Swimming Pool está já presente nas secção Críticas do Indieota)