Hélder Menor
Escrever sobre os Gasoleene é duplamente difícil. Primeiro, escrever sobre uma banda que tanto me diz, sobre canções que serviram de banda sonora a tantos momentos da minha vida nunca é simples. Depois, porque além de marcarem a minha vida pela música, os Gasoleene marcaram a minha vida de muitas outras maneiras.Desde lições de guitarra a idas à praia, muito do que sou hoje devo a estes tipos que nos anos 90, quando a terra rodava mais rápido e com mais distorção, resolveram lançar-se à conquista do mundo com pedais de fuzz e letras sobre campos de girassóis. Johnny Pinha- guitarra (The Sullens, The Brooms, Planeta Quadrado), António Jorge- baixo (Act-Ups, Bro-x), Fast Eddie Nelson- guitarra (solo, Fast Eddie and The Riverside Monkeys, Big River Johnson, The Sullens, Los Santeros) e Miguel Eucádio- bateria fizeram história, juntamente com outras duas bandas barreirenses contemporâneas: os Toast e os Unladylike Scream. Aqueles que viram estas bandas ao vivo recordam-nos unanimemente como um porradão sonoro desigual a quase tudo o que se passava no panorama nacional. O único álbum que gravaram, Polaroid Dream, é um caldeirão fervente, cheio de Dinosaur Jr., Sonic Youth e Pavement. Mas por si só, as influências não chegam para o descrever. Depois do som de uma cassete a entrar no leitor (viva os 90's) chega-nos um desvario meio psicadélico meio punk.Postcards from Wonderland agarra-nos pelo pulso e leva-nos a cavalo de dois acordes por colinas mágicas, campos de girassóis e terras onde não há tempo nem cartões de crédito.Rattlesnakes and the Monkey Juice começa à lá Nirvana e dá-nos um conselho para a vida: Temos de ver onde pisamos. Dear William embala-nos, com doçura e com violência, a violência doce que todas as boas músicas de amor (ou desamor) têm de ter. Faixas como Experience '99, Be My Love Doctor e Supersonic Wheelchair estão carregadas de eletricidade, de letras astutas e de experimentação artística ao mais alto grau. Já as faixas Twin Lip Part 4, Collapsing Sat, Twin Lip Part 8, 42-per-sec e Button são descritas pelo vocalista como 'Música Acidental de Campo de Ourique'. São momentos indescritíveis, com bobines a andar para trás e pedais de wah-wah e chorus a serem usados de uma forma muito liberal (atentem os leitores que nos anos 90 “liberal” não era uma palavra má).Ligados à Bee Keeper, uma editora independente lisboeta que deixou marcas na cena musical nacional como a grande experiência DIY da capital, entraram para as compilações Teenagers From Outter Space e Supermarket Music. Nestas compilações está presente a “nata” da música alternativa da nossa praça, bandas como Pinhead Society, Everground e Radioactive Man. Ficará também para a memória musical barreirense o concerto com os Lulu Blind no espaço Nicola, uma noite em que segundo confidência de Fast Eddie Nelson “Andava tudo maluco porque haviam concertos no Barreiro, o que quase nunca acontecia.”Se um dia passarem na muito humana cidade do Barreiro, podem em sítios como Os Penicheiros, a Escola Conde de Ferreira, o Pouca-Terra e a ADAO perguntar a um ou uma qualquer pré-quarentão(ona) sobre os Gasoleene. Podem ouvir o disco no Youtube. Mas infelizmente, não podemos voltar atrás no tempo e viver esta onda de novo. É assim a vida, fudida.