Hélder Menor
Passavam alguns minutos das 22 quando me estamparam o carimbo a dizer 'Excellent!' no braço.
Na esplanada do Eka Palace estavam cinco ou seis pessoas a fumar cigarros com ar sério e roupa de crescidos. Pedi uma torrada ao balcão e comi-a à pressa porque se começavam a ouvir os dedilhados de Caio.
A primeira impressão que tive foi que estava a assistir à aplicação do trovador medieval a uma sociedade urbana, mas se calhar foi do cheirinho de bagaço que tinha posto no café.
Entre o indie-folk e o pop à la Big Star, João Santos faz da composição uma arma de pontaria. Este rapaz descarregou, do início ao fim do concerto, um mosaico de canções orelhudas e cheias de textura. Reparem: quando digo “descarregou”, é porque é mesmo este o verbo que melhor reflete o que aconteceu - este concerto teria sido brilhante se interpretado de uma forma mais enérgica, com mais “sangue na guelra”. Um berro ou outro nunca fazem mal e, com um pouco mais de entusiasmo, Caio tem um potencial muito grande para fazer história no circuito lisboeta.
Depois de um cigarro à pressa (para quando o fim desta lei anti-tabaco fascista que impede que se fume em bibliotecas e galerias???) Grand Sun tocam os seus primeiros acordes. Fomos indicados pela banda a dançar no meio da sala enquanto eles tocaram. Segundo o teclista é “uma cena da arte”. Foi aí que soube que ia ser bom.
É óbvio para quem os ouve que os Grand Sun são versados em termos académicos, mas há teenage rage suficiente nos refrões e jindungo nas linhas de baixo para nos sentirmos numa festa de liceu passada no espaço (que, como todos sabemos, são as melhores festas de liceu). Uma malha a seguir à outra, sempre a melhorar e sempre a ganhar peso, provaram mais uma vez que se estão a afirmar como parte da nova geração da música na capital.
Este concerto teve um pico prematuro em 'Apolo', devido às restrições de horário, mas a bem dizer, todas as músicas podiam ser o single. Não é preciso só coragem para tocar música complexa sem pretensiosismos, é preciso, mais que tudo o resto, um amor ao rock & roll que os Grand Sun demonstraram ter. É de lhes tirar o chapéu, e mais que isso, é de não perder o próximo concerto!
Acima de tudo, esta noite das Produções Incêndio no Eka cheirou a novo, ao futuro a acontecer agora, num antigo palácio em Xabregas, numa Lisboa cada vez mais longe de um suburbano como eu.
Enquanto a gentrificação avança e muitos choram discotecas onde não iam há anos, coisas excitantes nascem como cogumelos. E enquanto assim for, podemos contar com muito pouco aborrecimento e muita música nova.