28 Dec
28Dec

Miguel Pinto


Com tantas listas vindas de todo o lado, mais uma não deve cansar não é? Aqui estão os nossos álbuns do ano:




12º

 Genes - Pessoas

Este álbum poderia estar aqui porque o Genes é o criador desta página, mas não é essa a razão (aliás se fosse por isso até estaria mais acima, não é…). É um álbum contraditório cujos principais trunfos são a sinceridade e o humor, que são capazes de puxar estas faixas da sujidade que as rodeia, mas onde também há lugar para o autoelogio (qual kidding on the square qual quê). Para acentuar ainda mais as contradições, o som soa irreproduzível apesar de ser feito de beats. Porém, dado o título do disco o contraditório passa a fazer todo o sentido. É um disco que soa à nossa geração, com um lo-fi despreocupado que motiva qualquer um a fazer música, além de ser um espelho para qualquer adolescente. Óptimo.





11º

 Pega Monstro - Casa de Cima

As irmãs Maria e Júlia Reis voltaram este ano com um álbum que não ultrapassa os seus antecessores, mas que contrariamente consegue ser a melhor fusão de rock e musica popular que já nos trouxeram. A música é mais calma que em qualquer um dos registos anteriores, e talvez seja isso que não nos mantêm tão agarrados como acontecia anteriormente. Porém, as letras diretas mantêm-se e a tal calma do som, mostram-nos uma banda mais introspetiva, mais madura até. Além disso, é um álbum que, inevitavelmente, não poderia ter sido feito em mais nenhum lugar senão Portugal. Soa nosso. E soa bem.





10º 

Nídia - Nídia é má, nídia é fudida

Em 2017, Nídia Minaj teve um ano em grande: lançou uma extraordinária faixa com (a deusa, por favor vem a Portugal) Fever Ray, além de ter lançado este seu primeiro longa duração, após alguns ep's em anos anteriores. Como se isso não bastasse, tanto a faixa como este álbum foram largamente aplaudidos pela crítica merecendo lugar nos top's de páginas como a Pitchfork ou até da Rolling Stone. Porém, curiosidades aparte, passemos à critica do album que estivemos a falar durante este tempo todo: estamos perante um disco duma extraordinária inventividade rítmica tal como a editora Príncipe já nos habituou, e deste modo não existe muita coisa nova (ai a contradição), ou seja, apenas grandes malhas umas atrás de outras. É de destacar porém a "House Musik Dedo", uma música que se situa na linha ténue entre a balada e a energia, e que apesar de não variar muito sonicamente ao longo dos seus três minutos, soa sempre interessante dada a capacidade de Nídia de compor e remisturar. Na verdade, essa capacidade inequívoca de usar a repetição para compor (e bem) faz de Nídia uma das grandes da eletrónica nacional. No fim de contas, acaba por resultar uma escuta muito interessante. A Nídia é mesmo fodida.





 Surma - Antwerpen

No primeiro álbum da nova sensação indie portuguesa ouvimos alguém capaz de inovar e mudar o rumo da música pop, trazendo-nos um disco duma melancolia hipnótica, bela e intensa, a remeter para os primeiros passos de Sigur Rós. Apesar de tudo, a dada altura, o álbum começa a soar um pouco repetitivo, em termos de som e tom, e talvez seja essa a razão pela qual não conseguiu ser gigante. Ainda assim, estamos perante uma obra lindíssima onde reina o detalhe e a subtileza, e que resulta numa ótima escuta nestes dias de chuva. 





Chinaskee & Os Camponeses - Malmequeres

Após alguns eps “servidos” em baixa fidelidade, recebemos o primeiro longa duração de Chinaskee & Os Campneses, um álbum banhado em efeitos, dum belíssimo rock capaz tanto daquele toque western à King Gizzard (veja-se "Má Água") como de nos transportar numa viagem psicadélica, não só devido ao som, mas também aos títulos da faixas que com duplo significado, mexem com a própria mensagem das letras. Excelente. Um dos grandes álbuns rock do ano em Portugal.





7º 

Primeira Dama - Primeira Dama

É sempre lindo vermos um artista a afirmar-se. É isso que ouvimos neste sophomore de Primeira Dama, a certeza de que este rapaz vem para ficar. Tal como no novo e também homónimo disco de Luis Severo destacam-se os arranjos, mas neste sobretudo a diversificação de som de faixa para faixa, provando que consegue soar bem em diversos registos (como se isso não tivesse já ficado provado com o seu projeto Migas). Primeira Dama é um álbum solarengo, jovem e melancólico por vezes, capaz tanto de soar extremamente belo e delicado (veja-se por exemplo a canção "Casa na Praia") como gingão pop (veja-se "Rua das Flores" ou "Mariana"). O único senão aqui poderia ser a duração de algumas faixas que se prolongam tempo demais, mas isso não impede que este seja um dos álbuns do ano e um óbvio destaque nesta lista.





 Pz - Império Auto-mano

Pz tem um estilo próprio sendo que de álbum para álbum o seu som não varia muito. Porém no caso dele isso é ótimo porque consegue sempre uniformizar as mais variadas influências criando um som único, que existe no seu próprio universo. Este Império Auto-Mano não é diferente: é um disco simples, direto e carregado de humor sobre os problemas do quotidiano. E que bom que é.





 Lula Pena - Archivo Pittoresco

Silêncio. Archivo Pittoresco, terceiro disco de Lula Pena após uma carreira de quase vinte anos é tudo o que a cantora nos mostrou até agora: uma viagem pelo mundo comandada pela calma e pela meditação, calma esta que parece envolver tudo o que a rodeia, desde a musica à maneira de viver. Não que este disco represente a vida, mas poderia (mesmo fora de pretensões). Há um sentimento de procura inerente à sua música que nos costuma guiar pelas suas viagens, apesar de vago: é o que mais uma vez acontece neste álbum, de forma mais natural que nos anteriores, devido à variedade de repertórios em diversas línguas e à linearidade e uniformidade das canções enquanto álbum. Resulta assim um exercício transcendente, delicado e irreproduzível habitado sobretudo por ambientes orgânicos e onde tudo parece ter um papel: desde a voz rouca de Lula à fluidez da guitarra. Embora seja um disco algo minimal e hipnótico, conseguimos sentir-nos cheios. Está aqui um dos grandes discos nacionais do ano. Até me sinto mais calmo.





O Morto - The Forest, the people and the spirits

Começamos por dizer que este foi o álbum mais desvalorizado do ano, provavelmente por este projeto ser ainda desconhecido para muitos. O Morto é o projeto a solo de Mestre André, membro da banda Älforjs, que neste álbum, nos mostrou o que é verdadeiro horror sónico: o ambiente pesadíssimo, as vozes a virem multiplicadas dos diversos cantos da tela auditiva, o denso negrume que envolve todo o álbum. The forest, the people and the spirits é um álbum exemplar em vários parâmetros: desde a construir um ambiente de pura sinestesia, assim como a gerar um clima irrequieto de medo e tensão. É o equivalente a estarmos perdidos numa floresta tropical à noite guiando-nos apenas pelos sons que dela vêm. Aliás, a tu que estás a ler isto, experimenta ouvir este disco com as luzes apagadas, só som. Spoiler alert: vais acabar por acendê-las.





 Luís Severo - Luís Severo

Após se ter confirmado como um dos grandes da canção feita em Portugal com Cara d’anjo, Luis Severo volta num registo que soa mais limpo e organizado, em termos de som, mas onde o principal destaque vai para as letras (veja-se "Escola", uma canção de paradoxos já que nos soa tão simples e pura, mas que é fruto de uma magnitude e experiência de escrita que não é digna de qualquer compositor) que no passado álbum já eram belíssimas, aqui revelam-se de uma delicadeza impactante, tão honestas e tão puras ao mesmo tempo. Aliás, neste registo existe sempre uma certa inocência que rodeia as faixas, devido tanto à elegância dos arranjos que envolvem o álbum como à calma voz de Luís. Um álbum perfeito, feito com minúcia e amor à canção. 





2º 

Ermo - Lo-fi Moda

Depois de um já excelente Vem por Aqui, Ermo presenteiam-nos com um clássico instantâneo, um álbum futurista, automático, visual, com um implacabilidade rítmica que ainda não tínhamos ouvido por cá no nosso país. O disco pode ser “visto” como um jogo de luzes e glitches, onde rapidamente atravessamos da escuridão para a incandescência, tal como o duo nos apresenta ao vivo. Resulta como fruto do que já somos e do que ainda viremos a ser, funcionando até segundo a banda, como uma crítica à sociedade moderna no mundo digital. No fim de contas, o que é certo é que este vai ser um dos grandes da década, um game-changer na nova música portuguesa. Uma elegia à originalidade, ou tal como a Time Out referiu, um dos grandes álbuns do ano dentro e fora de Portugal.





 Luís Severo - Pianinho

Por esta altura já devem ter achado que o Luís Severo nos subornou para pormos os discos dele todos no top 3 (ironia, quem é que nos ia subornar?), mas este era escolha óbvia. Ainda pensei abrir uma categoria de menções honrosas para o pôr lá, mas não fazia sentido. Este álbum apareceu do nada quando esta lista já estava mesmo quase terminada. Já tinha os Ermo como 1º lugar garantido, de longe, mas fomos surpreendidos. Este é um álbum que esperaríamos que Luís viesse a lançar algures na carreira, mas não este ano talvez nem sequer no próximo. Normalmente, quando um compositor ou banda lança um álbum ao vivo é porque já atingiu um certo estatuto, a sua afirmação já foi confirmada. Deste modo, ainda bem que Luís Severo o fez. Saiu na altura certa, no ano certo, até na data certa (a melhor prenda de natal do ano e até recebemos um bom dinheirinho). Literalmente, não existe nenhuma canção nova, mas aos nossos ouvidos existe. Praticamente todas as canções soam duma beleza esmagadora ao piano, ultrapassando facilmente as versões do álbum. E é raríssimo um álbum ao vivo fazer isto. Além disso, as canções conseguem transmitir a intimidade que é ver Luís Severo ao vivo (quem já viu sabe do que falo), além de nos mostrarem a paixão de alguém a fazer o que ama verdadeiramente, duma forma tão orgânica e quase espontânea. Por tudo isto e muito mais é que este álbum aqui está, no primeiro lugar. Não dizemos mais, é ouvir. 

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