Luís Teixeira
Não chovia ontem em Lisboa. A única coisa que havia em abundância ontem na avenida eram bandas, vindas de vários pontos do globo. A cidade estava viva, as ruas estavam vermelhas e recheadas de pessoas que tentavam acompanhar o ritmo imposto pelo festival ao longo dos anos. Correr de um lado para o outro a fim de chegar a um concerto a tempo parecia impossível, quem queria apanhar os verdadeiros destaques do dia tinha de escolher três ou quatro bandas com um intervalo de concerto de pelo menos uma hora, para quem fez um roteiro onde perder um concerto não seria hipótese acabou por chegar atrasado a quase todos ou até perder um outro concerto mais essencial, como foi o nosso caso. Uma das grandes falhas do nosso roteiro foi termos perdido Sunflower Bean que era um dos concertos mais essenciais de todo o festival. Por sorte ainda conseguimos apanhar os últimos minutos do concerto e ainda conseguimos contornar a segurança e encontrar-nos com a banda quando já estavam na tenda, os SB são a banda mais simpática de sempre! Pedi desculpas por ter perdido o gig e eles perceberam que era difícil organizar bem o horário do festival, não com a quantidade de bandas que havia. Apesar de tudo ainda tirámos um retrato da banda por trás do palco da estação ferroviária e ainda conseguimos tirar uma foto com eles, como groupies assumidos da banda.
Todos os concertos estavam lotados, o ambiente de festival é fantástico como já tínhamos previsto. Está na hora de fazer uma primeira síntese deste primeiro dia de Vodafone Mexefest.
18:00/19:30, Capitólio Terraço- Celeste/Mariposa
Celeste/Mariposa foi assim uma espécie de festa de boas-vindas par ao público que não sabia para onde ir até ao primeiro grande concerto da tarde/noite. Eram dois dj's, se bem que quando chegámos apenas vimos um, não sabíamos bem qual deles eram mas estava a passar uma grande compilação de funaná, afro-beat, até kizomba! Não havia muita gente, as pessoas estavam quase todas concentradas no Coliseu onde se comprava os bilhetes e este concerto nem seria o ponto alto do Capitólio nesse dia...
19:40/20:30, Sala Delta Palácio Foz- Filipe Sambado e os acompanhantes de luxo
Chegámos mais ou menos a meio do concerto e vimos um Palácio Foz totalmente lotado para ver Filipe Sambado e os seus vários amigos que tocaram com ele e ao qual os chamou de Acompanhantes de luxo. Eram sim acompanhantes de luxo, no teclado estava Manel Lourenço (Primeira Dama, Xita Records), na bateria Pedro Morrison (Mighty Sands, Spring Toast Records), no baixo estava Adriano Fernandes (Chibazqui)... Enfim, foi fantástico sentir o entrosamento, a química que todos estes músicos têm em palco, estamos a falar de amigos de longa data e editoras que formam uma irmandade de artistas e foi muito bonito sentir essa energia do palco para a audiência.
Sambado também soube agarrar bem o momento e foi tocando uns clássicos mais antigos e outros êxitos mais recentes, em "Vida Salgada" vimos a Sala Delta cantar a música numa só voz... Foi incrível ver a maneira como as pessoas conheciam estas músicas de Sambado, em como Filipe Sambado torna-se nesta figura muito amada da cidade e foi muito sentir essa energia do público também. Mesmo à frente do palco haviam muitos amigos a assistir ao concerto, como Rodrigo Araújo (Vaiapraia) ou Teresa Castro (Mighty Sands), até encontrámos Old Yellow Jack pela audiência... Foi um momento muito bonito que deve voltar a ser repetido num outro concerto de dias úteis, talvez um dos melhores do primeiro dia.
Saímos do concerto quando já se ouviam os primeiros acordes de "Aprender e Ensinar"...
20:25/21:25, Cine Teatro Capitólio- Mike El Nite + Nerve
Seguimos o nosso roteiro e fomos parar ao Capitólio, mas cedo percebemos que podíamos ter ficado até ao fim de Sambado, é que já expressámos uma vez e podemos voltar a fazê-lo, Nerve não é (de longe) um dos nossos rappers de eleição, de facto nem chegamos a considerar o rapper. Dito isto, passamos para o concerto de Mike El Nite que já se previa grande. Como o Justiceiro que é abriu o concerto atirando desenhos (provavelmente feitos por ele) com uma imagem dele que dizia "TUGA", uma referência a uma das novas faixas. Convidou L-ALi para cantas uma faixa de um EP anterior mas toda a gente no público queria ver Mike El Nite encarnar o Justiceiro e foi isso que aconteceu. Cantou "Santa Maria" ou "Água Fria", onde convidou o seu velho amigo também muito ocupado Prof Jam para cantar essa e o clássico "Mambo Nº1", toda a gente sabia as letras de cor e salteado, pela altura de "T.U.G.A" já víamos Mike El Nite fora do palco a cantar com o público e a incentivar alguns moshes e empurrões.
Concerto de Mike El Nite correspondeu com as expetativas, a confiança de Miguel Caixeiro transbordava para o público. Já Nerve não teve a mesma sorte, parecia que tinha por vezes de suplicar amor ao público, parecia muito nervoso também... No entanto ainda chegou a trazer a Capicua ao palco para uma canção, os seus convidados acabaram por brilhar mais que o próprio.
21:00/22:10, Teatro Tivoli BBVA- Bruno Pernadas
Mike El Nite não nos deixava sair do Capitólio por isso chegámos pela primeira vez ao Tivoli a 10 minutos do fim de Bruno Pernadas, que ainda assim nos presentou com um Tivoli absolutamente cheio, uma mão cheia de excelentes músicos, uma autêntica sinfonia melódica composta por 6 elementos convencionais (3 guitarras, um baixo, bateria e teclado) e três elementos clássicos (saxofone, trompete e a tuba). Chegámos a meio do clássico "Première", onde vimos todo o Tivoli cantar esta letra.
Não chegámos a apanhar nenhum clássico de "Crocodiles" ou "Worst Summer Ever" mas chegámos a apanhar uma jam entre Pernadas, o baixista e o baterista com várias nuances ruidosas e abrasivas, nunca deixa de ser interessante. No fim é aplaudido por um Tivoli que se levanta em uníssono.
21:40/22:30, Sala Delta Palácio Foz- Luís Severo
Concerto de Luís Severo foi especial por várias razões. Estava a comentar isso com algumas pessoas depois do concerto, vê-se mesmo que a tour com a Cuca Monga fez-lhe bem, foram assim umas mini férias que serviram para tirar muita tensão e stresse das costas, então via-se logo que Severo sentia-se nos céu enquanto tocava para nós, a longa barba mostra o desleixo e desinteresse numa estética pré-concebida e as jardineiras revelam a vontade do músico em voltar aos tempos de mocidade, outro momento bonito foi vermos Rodrigo Araújo (Vaiapraia), Primeira Dama (Xita Records) e Filipe Sambado fazerem os coros das suas músicas, o clima de irmandade que existe entre as editoras underground lisboetas é invejável e essa química não tem mesmo preço.
Chegámos a tempo de ouvir "Ainda é Cedo" e saímos quando se preparava para tocar "Lábios de Vinho", que era também a última música da sua set.
22:40/00:00, Teatro Tivoli BBVA-Dinamite/Celebração da Obra de Dena com: Ana Bacalhau, B Fachada, Best Youth, DaChick, D’alva, Márcia, Mitó e Tocha Pestana
Embora tenha sido uma celebração muito bonita das canções de Dina, o concerto roubou-nos a noção que tínhamos do tempo, pois ficámos até ao fim quase e assim nem conseguimos chegar à Estação do Rossio para ver Sunflower Bean que era mesmo o concerto essencial do primeiro dia de festival.
Aqui ainda apanhámos Best Youth, Da Chick e Alex D'alva Teixeira em palco, ainda vimos a Dina lá atrás a assistir à sua própria homenagem, diz-se que o Camané também estava na sala... Enfim uma grande homenagem que nos rouba um concerto que certamente não acontecerá tão cedo em Portugal. Se foi bonita a homenagem? Sim, foi. Se valeu a pena? Não.
23:20/00:10, Estação Vodafone FM/Estação Ferroviária do Rossio- Sunflower Bean (Essencial)
A grande falha do dia foi mesmo esta. Não vale a pena estar aqui a lamentar-me e a chorar por leite derramado, foi um erro nosso imperdoável. No entanto, ainda consegui apanhá-los perto da tenda e tirar um retrato à banda de indie rock mais cool de Nova Iorque desde os Diiv. Essa fusão de texturas sónicas (jangly, noise, dream) com melodias pop e estética pós-punk (trio onde a vocalista é também a baixista) faz de Sunflower Bean uma das bandas mais promissoras dos últimos tempos, quem assistiu a esse concerto pode muito bem confirmar as minhas palavras.
00:25/01:30, Coliseu dos Recreios- Jagwar Ma (Essencial)
Esse excesso de confiança da banda não jogou a favor do concerto. "Every Now And Then" não é de todo igual a "Howlin" um disco espiritual abençoado por influências obsoletas (Madchester nomeadamente) fundidas com texturas eletrónicas ora convencionais e apropriadas para clubes de dança mainstream ou alternativos, ora fundidos com texturas reverberantes e psicadélicas totalmente inconvencionais, não sei... Parece-me que este disco, como não traz os êxitos que "Howlin" trouxe não deve ser apresentado para um tão largo número de pessoas. O público também não era o mais favorável e não estava tão recetivo a explosões ou outras manifestações e a banda também sentiu essa falta de entusiasmo na pele. Os momentos mais emocionantes do concerto foram quando a banda tocou esses singles de "Howlin" como "Exercise", "Come And Save Me", verdadeiros hinos de estádio. "Ob1" seria a única faixa do novo disco que o público sabia cantar. No fim Gabril Winterfield acaba com um "Thank You" que foi tão seco como a performance da banda que nem voltou para um encore. Uma atuação desapontante, muitas expetativas foram criadas e o público muito pouco recetivo a este tipo de som explosivo (nalgumas estâncias) também não ajudou.
Fotografia: Rita Cuña
O primeiro dia foi agridoce, as bandas essenciais não foram ouvidas como deviam, falo de Jagwar Ma e Sunflower Bean, que, nem sequer foram ouvidos. Hoje espera-nos mais um dia recheado de boa música, as minhas apostas vão para Señoritas e Elza Soares, mas num festival tão imprevisível como este, tudo pode acontecer. De certeza que vai. Do Montijo Para Lisboa, Indieota na Avenida da Liberdade para a edição 2016 do Vodafone Mexefest.